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Artigo: Cada um no seu quadrado






Por: Daniel Trzeciak


O cenário político vivido no Brasil, hoje, permite que os Poderes constituídos – Executivo, Legislativo e Judiciário – exerçam muito mais influência que fiscalização. Extrapolando o idealizado sistema de freios e contrapesos, o que se vê atualmente é uma intensa chantagem institucional de todos os lados. O Judiciário ameaça legislar sob o formato de julgamento se o Legislativo não adotar determinado sentido. O Legislativo, por sua vez, ameaça reprimir qualquer julgamento do STF com novas medidas legislativas. E o Executivo, como não poderia deixar de ser, não só cede a pressões legislativas como forma de conseguir a tão sonhada governabilidade, como também barganha nomes a ganharem cadeira perpétua na Corte Constitucional do país.


De tudo o que fica é o desrespeito democrático, onde cada Poder busca reafirmar-se invadindo a competência do outro. Desvirtuou-se a clássica tripartição dos poderes. E a cada ação, de qualquer que seja o Poder, uma enxurrada de reações é prontamente executada.


Veja-se, para ficar bem atual, a questão da descriminalização do aborto até 12 semanas, em julgamento no STF, com o primeiro voto favorável, da Ministra Rosa Weber. Foi o estopim para desarquivar e acelerar, no Congresso, o chamado “Estatuto do Nascituro”, em defesa da vida desde a concepção. A questão do marco temporal, igualmente. Foi o STF acenar com o julgamento que o Congresso se apressou a apreciar e, mesmo assim, segue o julgamento por supostamente não ter sido o resultado do agrado dos ministros julgadores. Em contrapartida, é o STF inflar-se (indevidamente) em determinada situação para que o Legislativo retome movimentos em prol do mandato fixo para Ministros da Corte Constitucional, ou mesmo retome discussões sobre o eventual melhor formato de indicação de Ministros.


O STF, por sinal, arvorar-se na condição de legislador positivo, transmite a sensação de que não importa mais soberania popular consagrada pelo voto. Os representantes da sociedade não são (e nunca devem ser) apenas 11 pessoas escolhidas por 1 só. Há um Congresso eleito por 200 milhões de pessoas para encaminhar os anseios da população. Havendo desalinhamento constitucional, aí sim deve o Supremo Tribunal Federal atuar, sempre para inibir a lei, nunca para legislar e inovar no ordenamento jurídico.


Vivemos hoje um cenário em que não há respeito pela independência, nem mesmo apreço pela harmonia entre os Poderes. Se supostamente um tema está em desacordo com o que um dos Poderes pensa, mesmo sem ser de sua alçada, dá-se um jeito de alterar com as forças que se tem. O objetivo não é o aprimoramento da República e passa longe também do aperfeiçoamento da democracia. Busca-se a intromissão, o ataque, a subserviência, como forma de conseguir êxito em alguma pauta de interesse da corporação ou do sistema estabelecido.


Arranha-se a democracia com a mesma ânsia que se deseja mantê-la íntegra. O sabor dos interesses é que tempera os sentimentos.


Que bom seria se conseguíssemos realinhar os limites de cada Poder. Não é vangloriar “quem pode mais”. Seria apenas manter “cada um no seu quadrado”. Ganharia o Brasil sem essa turbulência institucionalizada.


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